sábado, 31 de outubro de 2015

A arte de rua que sobrevive nos arredores do Terminal Urbano

Dos estrangeiros aos brasileiros que expõem o melhor de uma cultura

Estivemos no local para conhecer este “menu” cultural e compartilhamos a trajetória de vida e profissional de pessoas simples (Fotos Wanglézio Braga)

O endereço é o de sempre: Avenida Brasil com Rua Sergipe N° 321 – Centro de Rio Branco (AC). Milhares passam todos os dias por este local para pegar o transporte coletivo, outros trabalham nos comércios da redondeza, mas também passam por lá e ainda existem aqueles que vão a passeio.  Em meio à vida corrida é perceptível que a cultura da arte de rua vem sobrevivendo ali no coração da cidade.

Há tempos, o entorno do Terminal Urbano de Rio Branco vem se tornando ponto de encontros de viajantes estrangeiros e de artistas brasileiros que trabalham com pinturas, peças de teatro, canto e até dança. Um verdadeiro cardápio cultural a sua disposição. Com ou sem moedas, o importante é compartilhar uma visão diferenciada das coisas da vida, do estilo de uma sociedade ou quem sabe de um mito.

Estivemos no local para conhecer este “menu” cultural e compartilhamos a trajetória de vida e profissional de pessoas simples que sobrevivem de poucas moedas deixada por admiradores mais sobretudo de cultura. Gente que veio da Colômbia, Roraima e Rondônia com o único objetivo: Apresentar a sua arte.

No chão: O giz e carvão  

Nem mesmo o vai e vem dos pedestres no calçadão, o barulho dos ônibus e o calor excessivo tiram a atenção do jovem Cristian Olaya, 23 anos. Ele é artista de rua há oito anos, nasceu na Colômbia e está no Acre de passagem depois de uma temporada pela região norte, nordeste e centro-oeste do Brasil. Ele fica em Rio Branco até dezembro onde tenta regressar para sua cidade de origem, Bogotá.  
  
 Cristian Olaya usa as técnicas de Giz e Carvão para desenhar na calçada 
(Foto: Wanglézio Braga)

O que difere Cristian dos demais artistas são as técnicas que ele utiliza para desenhar. Giz escolar colorido, aqueles usados em lousas, e carvão vegetal são as suas ferramentas de trabalho. Mais talvez você esteja se perguntando, onde ele traça seus personagens? No chão!  Isso mesmo, na calçada.

De baixo do frondoso pé de Apuí, Cristian desenha personagens da fauna e flora, bem como rosto de personalidades que contribuíram de alguma forma para o mundo. Por dia ele tem o alvo de desenhar dois personagens.

“Por um lado é como se estivesse falando, opinando sobre diversos assuntos. Com os desenhos posso falar de um tema específico ou idéias que tenho na minha cabeça. Talvez uma forma de manifestação contrária a proposta de um político que não gostei posso também fazer um desenho sobre isso”, comenta.

Antes de começar a desenha ele analisa o local, o fluxo de pessoas e até as condições do solo. A técnica pode até parecer simples, mais não é. Enquanto desenha, fica atento ao seu redor, afinal, a chance de alguém pisar nos moldes e estragar o desenho é grande. Mais ele disse que já está acostumado, apesar de compreender que o espaço é público.

“Infelizmente a pintura é muito celetista por conta das galerias. Você tem que ter muitos quadros para formar uma exposição. Além disso, as pessoas daqui não têm muito a cultura de ir aos museus, galerias, então resolvi trabalhar assim para todo mundo. Mostro a minha arte para rapaz que vende água até para aqueles que possuem muito dinheiro”, diz.

E quando a chuva cai e leva literalmente seus desenhos? Para ele é um momento especial, tempos de renovação. “Gosto quando a chuva cai e leva o meu trabalho depois de pronto. Passa a sensação de dever cumprido. É um trabalho natural, um processo normal”, salienta.

O artista aproveita para deixar um recado aos seus expectadores e também para quem passa pelo local. “Tirem pelo menos alguns minutos para ver, analisar e sentir a arte. Não deixem que a rotina da vida tire de vocês essa chance de observar a arte. Sejam críticos, leiam livros, observem o que estamos fazendo e também contribuam”, finaliza.

Música – O canto que uniu Acre e Roraima

A arte é capaz de selar também o amor. A prova dessa afirmativa vem do casal de músicos João Grilo (35) e Gabriela Lima (26). Ela veio de Roraima, ele é daqui. Ambos se conheceram num espetáculo de teatro. Depois de algum tempo namorando, resolveram viver juntos e criaram um projeto de música “Voz, Violão e Bongô” desenvolvido no Calçadão da Epaminondas Jácome.

Os planos do casal de músicos é viajar para o nordeste do Brasil / (Foto: Wanglézio Braga)
O projeto vem dando certo. Uma vez por semana, com a ajuda do filho Antônio (06), eles cantam um repertório de aproximadamente 40 músicas entre popular brasileira até baião do Gonzaga. Com um caderninho na mão, os músicos seguem a risca o repertório que é adaptado para lugares como praças, calçadão e o próprio Terminal. Sucessos de Jackson do Pandeiro, Luiz Gonzaga, Roberto Carlos e outros que os admiradores estão acostumados a ouvirem são incluídos nas apresentações.

“Esse é um meio de levar ás pessoas energia positiva. Afinal, é estressante o vai e vem, o trânsito e também o próprio trabalho delas. Cantar é muito bom e quando as pessoas param para receber, por meio da música, uma mensagem de força isso nos dá a alegria de continuar trabalhando aqui”, enfatiza Gabriela que recebe afirmativa de João Grilo “Chegam diversos tipos de públicos, nem todos conseguimos agradar. São pessoas de várias classes. A receptividade é boa. Aqui no centro é interessante porque muitos passam na correria, param e começam admirar nosso trabalho, deixam uma contribuição e voltam depois. Muitos parabenizam e elogiam nossos esforços”.

Gabriela define o trabalho deles como “manguiá” um termo que significa “a arte no caminho do meio”. “Isso ocorre quando você trabalha como autônomo com a arte, e começam a produzir, as pessoas interagem e contribuem. Posso afirmar que dá pra viver desta maneira”, ressalta.

Os planos do casal de músicos é viajar para o nordeste do Brasil. Por lá, eles querem incluir a sanfona nas apresentações. Estão planejando esta viagem para os próximos meses.

Os artistas também aproveitaram a oportunidade para deixar um recado especial ao público. “Quando nos ouçam ou vejam nossos artesanatos, parem e apreciem. Faça uma reflexão, ela vai ajudar a absorver algo de bom que queremos passar. Tentamos passar um sentimento melhor. Se estiver amargurado ouça uma música e veja que seus problemas serão passageiros”, finalizam.

Robson Dutra – A Estatua Viva

Há 10 anos ele faz tudo sempre igual; Arruma a mochila com maquiagem e adereço de seu personagem e sai pra trabalhar. Robson Dutra (27) nasceu em Rondônia, veio ao Acre para uma apresentação na Expoacre e nunca mais saiu daqui. É em torno do Terminal Urbano que ele mostra suas habilidades como “Estatua Viva”.

Robson nasceu em Rondônia e atua como Estatua Viva (Foto:Wanglézio Braga)
O gosto pela arte vem desde criança. Durante a vida, conheceu pessoas que impulsionaram a seguir esta carreira. Atua também como palhaço, é humorista, faz apresentações em eventos de casamento, formatura e em gerais.

Mais é nos arredores do Terminal Urbano que ele tira o sustento da família. Depois de passar a tinta prateada, vestir a roupa especial lá se vai para mais um dia de movimentos ora bruscos, ora suaves. Mais sua jornada não é tão fácil como imaginam, afinal, nem todos sabem valorizar seu trabalho.


“A maior dificuldade seria demonstrar as pessoas sem conhecimento, como apreciar a minha área de trabalho. Quero passar a elas que não estou mendigando, mais sobrevivo da arte. Lá fora, tenho um trabalho bem reconhecido, aqui posso dizer também que tenho, porém, ainda as pessoas não sabem valorizar esse tipo de apresentação”, ressalta.

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